Após longo esforço para fechar a revisão do projeto de pesquisa para apresentação na matéria "Seminários de Pesquisa" (com vários acréscimos em relação ao projeto original, que logo estarão aqui no formato de artigos), voltou a acionar o radar para as notícias que interessam para as nossas discussões sobre neodesenvolvimentismo, política industrial e assuntos afins.
Uma notícia me chamou atenção nessa volta. Publicada no jornal Valor Econômico do dia 27 de maio, o texto do professor de economia Javier Santiso fala sobre um estudo feito pela Empea/Coller Capital, divulgado em abril de 2011, que aponta o Brasil como destino preferencial dos investimentos de capital de risco. Segue link da matéria:
https://conteudoclippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2011/5/27/brasil-destrona-a-china
Os detalhes da matéria podem ser lidos ai. Alguns elementos me chamaram atenção. Primeiro, os investimentos destacados de Venture Capital, ou seja, aqueles investimentos voltados para empresas novas, sem as quais as Microsofts e Apples da vida nunca teriam saído da garagem. O ponto aqui é que esse tipo de investimento não reforça a base tradicional da nossa matriz econômica (focada em commodities e bens de baixo valor agregado), mas vai em sentido contrário, ou seja, em empresas novas, voltadas para novos mercados, principalmente ligadas às novas tecnologias. São citadas como empresas que receberam aportes desses fundos de risco as seguintes: Buscapé e Submarino (essa, uma das poucas a negociar ações na Bovespa). Assim, apesar do foco no capitalismo selvagem e no lucro alto, esses investimentos não deixam de ser um fôlego extra para os brazucas que querem surfar na onda das empresas.com.
Em contraste, a matéria também mostra que os fundos de capital de investimento locais também tem crescido, porém com baixos investimentos em empresas "start-up" (embrionárias) no setor de tecnologia. Ao que consta, os investidores nacionais reforçam a nossa matriz econômica conservadora, preferindo aplicar seu dinheiro em setores mais tradicionais.
Por fim, a nota dissonante do clima otimista do texto, que destaca o fato do Brasil ter superado a China como principal destino desse tipo de investimento, é a comparação feita com Israel em matéria de empresas "start-up" no setor tecnológico. Só um indicador da nossa defasagem nesse campo: o Brasil ainda não tem nenhum empresa cotada na NASDAQ enquanto Israel tem 60! Ou seja, o caminho é longo até nos tornarmos uma potência também em matéria de tecnologia e não só de frango congelado e minério de ferro.
Resumida a matéria, é impressionante que em momento algum haja qualquer menção ao papel da política industrial na condução desse lugar privilegiado do Brasil no cenário do Venture Capital global. Impressiona que, ao falar da atratividade das empresas .com brasileiras para esse tipo de capital internacional, nada seja mencionado sobre o apoio do governo a essas empresas ou sobre a regulamentação sobre o mercado de capitais de modo a otimizar a atração dos mesmos para o Brasil.
Nesse ponto, é interessante comparar esse texto do Santiso com um texto anterior, publicado quando da divulgação do estudo, em abril, que enfoca mais as explicações do porquê o Brasil superou a China na atratividade desse tipo de capital. Segue o link da matéria:
http://www.bzplan.bz/pt/noticias/42-fundos-de-investimento/149-brasil-assume-primeiro-lugar-em-private-equity
Segundo esse texto, o principal motivo do Brasil ter superado a China nesse setor foi o encarecimento dos negócios de "Private Equity", ou seja, a compra de uma empresa promissora para sua venda posterior. Esse encarecimento deveu-se (ai é o ponto que eu quero destacar em termos de atuação do Estado) à regulamentação desse tipo de negócio por parte do governo Chinês, que, após o comprovado sucesso desse tipo de negociação nos anos anteriores, decidiu favorecer os fundos denominados em yuans. Ou seja, favorecer os fundos locais e não mais os fundos estrangeiros, que tiveram que reposicionar os seus dutos de dinheiro para outros mercados emergentes. Nesse redirecionamento, o Brasil assumiu fatias importantes antes destinadas a países do Leste Europeu e da Rússsia. No "acumulado", passou, em volume de investimentos, os antigos "queridinhos" China e Índia.
Outros fatores trazidos pelo artigo como motivações para o belo posicionamento brasileiro são: as perspectivas de crescimento da economia brasileira, a baixa competitividade nos setores médios e baixos da economia (excluindo, portanto, os setores dominados por gigantes globais) e, outro ponto bastante divulgado por nomes como Barack Obama quando compara o Brasil e a China (países citados recentemente em visita do presidente americano à Grão-Bretanha): a estabilidade política, apontado como fator de risco por apenas 3% dos entrevistados, contra 63% no caso da Rússia, 24% da China e 11% da Índia. Nunca os sólidos pilares democráticos reconstruídos a partir de 1985 foram tão valiosos.
Essa duas matérias dão novas mostras da fase ascendente da economia brasileira. É mais dinheiro vindo para o país e, no caso dos Venture Capital, sendo investido em setores ligados às áreas tecnológicas. Porém, tanto nesta quanto na matéria anterior, ficou patente, pelo menos na visão dos autores dos textos, a ausência do Estado brasileiro como tributário desse avanço. Acredito que para me posicionar aqui, eu precisaria investigar exatamente as ações governamentais (se é que elas existiram) para fomentar a atração de Venture Capital e Private Equity para o Brasil. Porém, seria no mínimo intrigante descobrir que um movimento significativo de entrada de capitais como este (mais de US$ 3,5 bilhões em 2010), bem como uma posição privilegiada em relação aos outros países emergentes, especialmente a China, passou desapercebido pelos promotores da política industrial, tecnológica e de comércio exterior, seja para colherem os louros das suas ações, sejam para implementar medidas de ampliação desse fenêmeno.